Mateus 5.7 – BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

 

 


"Bem-aventurados os misericordiosos, pois obterão misericórdia" (Mt 5.7 NVI).


Introdução

 

Comecemos logo destruindo toda e qualquer possibilidade de agirmos de modo diferente pelas seguintes razões:

Efésios 2.4-5 - “Todavia, Deus, que é rico em misericórdia, pelo grande amor com que nos amou, deu-nos vida juntamente com Cristo, quando ainda estávamos mortos em transgressões — pela graça vocês são salvos. Deus nos ressuscitou com Cristo e com ele nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus.”

1Tm 1.15-16 – “Esta afirmação é fiel e digna de toda aceitação: Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o pior.
“Mas, por isso mesmo alcancei misericórdia, para que em mim, o pior dos pecadores, Cristo Jesus demonstrasse toda a grandeza da sua paciência, usando-me como um exemplo para aqueles que nele haveriam de crer para a vida eterna.”

Tito 3.4-6“Mas quando se manifestaram a bondade e o amor pelos homens da parte de Deus, nosso Salvador,
não por causa de atos de justiça por nós praticados, mas devido à sua misericórdia, ele nos salvou pelo lavar regenerador e renovador do Espírito Santo,
que ele derramou sobre nós generosamente, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador.”

Desse modo Jesus nos ensinando sobre o perdão diante de uma pergunta de Pedro, em uma bela parábola nos mostra quão horrível é quando agimos para com as pessoas sem misericórdia (Mt 18.21-35 – a parábola do credor incompassivo).

Diante desse dever que nos é imposto há algumas indagações que queremos levantar?

 

 

I – Como nos tornamos pessoas misericordiosas?

 

Mais uma vez a resposta remete ao contexto dessa palavra. Tornamo-nos ou temos toda a possibilidade de vivenciarmos a misericórdia em nossas vidas a partir do momento em que nos esvaziamos de nós mesmos ao ponto de sermos pobres de espírito, chorarmos pelos nossos pecados, sermos mansos no trato com o próximo, desejarmos mais a presença de Deus e ao termos fome e sede de justiça  passamos a olhar as pessoas de modo mais semelhante a como Cristo olhava.

 

 

II – Qual a essência da misericórdia?

 

Para entendermos a misericórdia vejamos o que não é ser misericordioso. Façamos isso por meio exemplos bíblicos.

a) Não é possível sermos misericordiosos se deixarmos de olhar para as pessoas.

"Passando por ali, Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado na coletoria, e disse-lhe: "Siga-me". Mateus levantou-se e o seguiu.

Estando Jesus em casa, foram comer com ele e seus discípulos muitos publicanos e "pecadores".
Vendo isso, os fariseus perguntaram aos discípulos dele: "Por que o mestre de vocês come com publicanos e ‘pecadores’? "
Ouvindo isso, Jesus disse: "Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes.
Vão aprender o que significa isto: ‘Desejo misericórdia, não sacrifícios’. Pois eu não vim chamar justos, mas pecadores" (Mt 9.9-13 NVI).

Vemos nesse texto duas visões acerca daquelas pessoas, a primeira é a dos fariseus. Estes estavam demasiadamente preocupados com suas leis cerimoniais, com sua visão distorcida na qual os afastava das pessoas; quanto mais ‘pecadoras’, mais distantes eles queriam estar. Em um suposto zelo pela Lei não conseguiam ver as pessoas, colocavam-se acima delas. A segunda visão é a de Jesus, que consegue ver as necessidades espirituais daquelas pessoas, vê-las como doentes que precisam de médico. Lembra, portanto, aos fariseus que a misericórdia já estava prescrita na Lei em Oseias 6.6: “Pois desejo misericórdia e não sacrifícios; [...]”.

 

b) Não é possível sermos misericordiosos se valorizarmos em primeiro plano aquilo que está em segundo plano.

"Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês dão o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, mas têm negligenciado os preceitos mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Vocês devem praticar estas coisas, sem omitir aquelas.

Guias cegos! Vocês coam um mosquito e engolem um camelo" (Mt 23.23-24 NVI).

Para os fariseus o mais importante era o cumprimento seco, formal de preceitos da Lei. Jesus lhes ensina que tais ordenanças deviam ser observadas, mas sem negligenciar aquilo que é mais importante: a justiça, a misericórdia e a fé (ARA).

Certa ocasião, um perito na lei levantou-se para pôr Jesus à prova e lhe perguntou: "Mestre, o que preciso fazer para herdar a vida eterna? "
"O que está escrito na Lei? ", respondeu Jesus. "Como você a lê? "
Ele respondeu: " ‘Ame o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todas as suas forças e de todo o seu entendimento’ e ‘Ame o seu próximo como a si mesmo’".
Disse Jesus: "Você respondeu corretamente. Faça isso, e viverá".
Mas ele, querendo justificar-se, perguntou a Jesus: "E quem é o meu próximo? "
Em resposta, disse Jesus: "Um homem descia de Jerusalém para Jericó, quando caiu nas mãos de assaltantes. Estes lhe tiraram as roupas, espancaram-no e se foram, deixando-o quase morto.
Aconteceu estar descendo pela mesma estrada um sacerdote. Quando viu o homem, passou pelo outro lado.
E assim também um levita; quando chegou ao lugar e o viu, passou pelo outro lado.
Mas um samaritano, estando de viagem, chegou onde se encontrava o homem e, quando o viu, teve piedade dele.
Aproximou-se, enfaixou-lhe as feridas, derramando nelas vinho e óleo. Depois colocou-o sobre o seu próprio animal, levou-o para uma hospedaria e cuidou dele.
No dia seguinte, deu dois denários ao hospedeiro e disse-lhe: ‘Cuide dele. Quando voltar lhe pagarei todas as despesas que você tiver’.
"Qual destes três você acha que foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes? "
"Aquele que teve misericórdia dele", respondeu o perito na lei. Jesus lhe disse: "Vá e faça o mesmo"  (Lc 10.25-37 NVI).

A falta de misericórdia leva as pessoas a não exercerem empatia, a se preocuparem com trivialidades, a serem mais religiosas do que discípulas de Cristo, a se ocuparem mais com coisas secundárias do que com o que é mais importante.

Não será difícil vermos as pessoas se portarem do modo contrário ao exercício da misericórdia. Nãos será difícil para nós nos portarmos assim. Portanto, tenha cuidado, pois o caminho da NÃO MISERICÓRDIA é muito fácil. Que você possa antes de ver a situação, detalhes religiosos, e coisas semelhantes; ver as pessoas, vê-las em sua dores, em suas necessidades.

Aprendemos nesse texto que a misericórdia nos leva a ação (v. 10.34).

A misericórdia nos leva a agir mesmo que o outro tenha inimizade conosco. Vemos no texto um samaritano cuidando de um judeu.

Um detalhe nesse texto de Lucas deve ser observado com cuidado, Jesus trouxe como exemplo de pessoas que não exerceram misericórdia aquelas que tinham responsabilidades religiosas. Isso nos alerta para o perigo de que quanto mais nos aproximamos dos deveres da igreja instituição mais podemos correr o risco de sermos insensíveis diante do sofrimento do outro; porque estamos ocupados demais, porque de algum modo achamos que já estamos fazendo muito, ou outras desculpas que queiramos nos dar. Parafraseio Jesus dizendo que você possa se envolver nas coisas da igreja institucional sem negligenciar o mais importante no Reino e Deus: demonstrar o amor de Cristo em nossos corações de modo que o Senhor seja glorificado em nossas vidas e as pessoas sejam conquistados por esse exemplo de amor e  misericórdia.

 

"Misericórdia" é compaixão pelas pessoas que passam necessi­dade. Richard Lenski proveitosamente distinguiu-a da "graça": "O substantivo eleos (misericórdia) . . . sempre trata da dor, da miséria e do desespero, que são resultados do pecado; e charis (graça) sempre lida com o pecado e com a culpa propriamente ditos. A primeira concede alívio; a segunda, perdão; a primeira cura e ajuda, a segunda purifica e reintegra.” (STOTT, 1981).



III – Podemos ser misericordiosos em todos os momentos?

 

Essa pergunta deve ser levantada diante de situações práticas que inevitavelmente exigem uma linha de ação diferente. Exemplos: é possível a um empregador ser misericordioso ao mesmo tempo em que tem que demitir um funcionário relapso? Um pai ser misericordioso com seu filho desobediente ao mesmo tempo em que tem que discipliná-lo(a)? É possível a um policial que é cristão exercer a misericórdia ao mesmo tempo em que tem que prender um meliante? Outras tantas indagações poderiam ser levantadas.

Diante desses problemas práticos a resposta é o equilíbrio. A nossa atitude deve dar um testemunho a respeito do Senhor. Com nossas ações temos que demonstrar que Deus é justo, exerce justiça, portanto, e que é amoroso, e por isso age com misericórdia. Em alguns momentos necessitarmos agir de modo que a justiça seja enaltecida, por exemplo, ao disciplinar um filho para o seu bem. Em outros momentos, apesar do desmérito da pessoa podemos optar por dar uma segunda chance, isso é agir com misericórdia.

Para sabermos o curso de ação aplicável em cada caso dependerá da sabedoria que temos em Cristo.

Podemos ser misericordiosos em todos os momentos? A resposta é que precisamos saber demonstrar justiça sem deixarmos de ser misericordiosos, e sabermos ser misericordiosos sem deixarmos de sermos justos.

 

 

IV – Se a salvação é pela graça por que somente os misericordiosos encontrarão misericórdia?

 

A afirmação do versículo não significa que o Senhor será misericordioso apenas com quem foi misericordioso, pois desse modo a própria essência da misericórdia perderia seu significado. Mas um testemunho de que pelo fato de o SENHOR já ter sido misericordioso conosco torna-se possível a nós vivermos de modo a expressar misericórdia. Como bem explica John Stott:

Não que possamos merecer a misericórdia através da misericórdia, ou o perdão através do perdão, mas porque não podemos receber a misericórdia e o perdão de Deus se não nos arrependermos, e não podemos pro­clamar que nos arrependemos de nossos pecados se não formos misericordiosos para com os pecados dos outros. Nada nos impulsiona mais ao perdão do que o maravilhoso conhecimento de que nós mesmos fomos perdoados. Nada prova mais claramente que fomos perdoados do que a nossa própria prontidão em perdoar. Perdoar e ser perdoado, demonstrar misericórdia e receber misericórdia andam indissoluvelmente juntos, como Jesus ilus­trou em sua parábola do credor incompassivo. (STOTT, 1981, grifo nosso).

 

EM OUTRAS PALAVRAS, é sermos coerentes com o que falamos que somos, isto é, não dar para ser verdadeiramente cristão sem exercer misericórdia.

 

 

Conclusão

 

Que você possa ter o equilíbrio necessário para vivenciar a misericórdia em sua vida! Para isso:

 

1. Tente ver os outros como gostaria de ser visto, e como o outro tem conseguido ver a si mesmo. Em outras palavras, é tratar o outro como gostaríamos de sermos tratados.


2. Um dos grandes entraves pra o exercício da misericórdia é o egoísmo. Algumas perguntas para sua reflexão: qual foi a última vez que você doou algo sem olhar o mérito da pessoa? Como tem estado sua preocupação para com as pessoas que não são próximas a você? Quando você parou para ouvir de verdade alguém? Qual foi a última vez que você intercedeu por alguém? Qual foi a última vez que você aceitou perder uma discussão?

 

3. Não procure motivo para agir com misericórdia, esteja agindo pelo o que Deus é e pelo o que Ele fez em sua vida! Que você se sinta constrangido a responder à misericórdia e graça do SENHOR para com você agindo de modo semelhante para com as pessoas.

 



 Referência

 

STOTT, John R. W. Contracultura Cristã: A mensagem do Sermão do Monte. ABU Editora S/C, São Paulo, SP, 1981.


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