Êxodo 20.17 - O Décimo Mandamento: uma proteção contra a ambição errada

 



"Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem seus servos ou servas, nem seu boi ou jumento, nem coisa alguma que lhe pertença" (Ex 20.17 NVI).



Introdução


           Os mandamentos revelam a vontade de Deus para um relacionamento saudável com o Senhor e com o próximo. São válidos para nossas vidas como princípios éticos fundamentais explicados e expandidos por Jesus no Novo Testamento. Uma forma correta de interpretar um mandamento bíblico é verificar seu lado proibitivo e o modo positivo como ele pode ser concretizado em nossas vidas.

         O décimo mandamento é uma proteção em nossas vidas contra a cobiça desmedida, portanto contra a inveja.

         A palavra inveja é muitas vezes confundida em seu significado com ciúme. E realmente tem um sentido prático muito próximo. Segundo o dicionário Aurélio inveja é: 1 Desgosto pelo bem alheio. 2 Desejo de possuir o que outro tem (acompanhado de ódio pelo possuidor). Ciúme então segundo o Aurélio é: 1 Receio ou despeito de certos afetos alheios não serem exclusivamente para nós. 2 Inveja. 3 Receio. Ou seja, o dicionário Aurélio apresenta-os como sinônimos, com pequenas diferenças.

           Então poderíamos dizer que o ciúme é cobiça pela riqueza e a honra do outro, a inveja é algo que se faz acompanhar de rancor.  A inveja não é necessariamente querer para nós mesmos, mas simplesmente querer que seja tirado do outro.

       Os termos bíblicos que encontramos para esse sentimento são:

Chamad – Palavra hebraica que é traduzida por cobiça. Tem o sentido de “possuir no coração uma intenção oculta que mais tarde se manifesta em ações concretas de furto e roubo” (Reifler, 2009).

Pleonexia – Palavra grega que traz o sentido de “desejo incontrolável de possuir o mundo e seus bens materiais, poder, influência e prestigio” (Reifler, 2009).

Philarguria“Amor desordenado pelo mundo” (Reifler, 2009).

Epithumia – Também do Novo Testamento, é traduzida por “cobiça, intenção impura, ambição, desejo intenso, desejo ardente, aspiração” (Reifler, 2009).

 

I – Textos bíblicos proibitivos do A. T.


           No Antigo Testamento há muitos textos que apresentam a versão inibidora e crítica do décimo mandamento. Mencionaremos apenas alguns.

           Observemos que desde o Gênesis este sentimento maligno tenta o ser humano, Gênesis 3.6 descreve suas características principais: influencia o paladar, é agradável à vista e afeta a mente: “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu e deu também ao marido, e ele comeu”. (Gn 3.6)

           Números 11.4 descreve a cobiça do povo de Israel em voltar a comer as comidas egípcias, quando murmuraram contra o Senhor porque desejam comer carne: “E o populacho que estava no meio deles veio a ter grande desejo das COMIDAS dos egípcios; pelo que os filhos de Israel tornaram a chorar e também disseram: Quem nos dará carne a comer?” (Nm 11.4, grifo nosso). Vemos no contexto que mesmo tendo sido abençoados pelo Senhor com a providência do maná, mostravam-se insatisfeitos. O cobiçoso normalmente será ingrato, não reconhecerá o que o Senhor já fez por ele.

            2 Samuel capítulo 11 nos mostra Davi cobiçando Bate-Seba e o resultado disso foi a quebra também do sétimo e do sexto mandamentos. Ele adulterou e depois assassinou. Esse texto deve nos fazer refletir que a cobiça pode começar de modo muito sutil, mas pode vir a dominar o coração e levar a consequências desastrosas.

          Um texto bastante lembrado é o da cobiça de Acabe pela vinha de Nabote em 1 Rs 21.1-7:

1Sucedeu, depois disto, o seguinte: Nabote, o jezreelita, possuía uma vinha ao lado do palácio que Acabe, rei de Samaria, tinha em Jezreel.

2Disse Acabe a Nabote: Dá-me a tua vinha, para que me sirva de horta, pois está perto, ao lado da minha casa. Dar-te-ei por ela outra, melhor; ou, se for do teu agrado, dar-te-ei em dinheiro o que ela vale.

3 Porém Nabote disse a Acabe: Guarde-me o SENHOR de que eu dê a herança de meus pais.

4 Então, Acabe veio desgostoso e indignado para sua casa, por causa da palavra que Nabote, o jezreelita, lhe falara, quando disse: Não te darei a herança de meus pais. E deitou-se na sua cama, voltou o rosto e não comeu pão.

5 Porém, vindo Jezabel, sua mulher, ter com ele, lhe disse: Que é isso que tens assim desgostoso o teu espírito e não comes pão?

6 Ele lhe respondeu: Porque falei a Nabote, o jezreelita, e lhe disse: Dá-me a tua vinha por dinheiro; ou, se te apraz, dar-te-ei outra em seu lugar. Porém ele disse: Não te darei a minha vinha.

7 Então, Jezabel, sua mulher, lhe disse: Governas tu, com efeito, sobre Israel? Levanta-te, come, e alegre-se o teu coração; eu te darei a vinha de Nabote, o jezreelita”.

          Nos vv. 8-16 vemos o trágico desfecho dessa história, como Jesabel consegue de modo maligno que se levante falsa acusação contra Nabote e consequentemente a sua condenação à morte. A cobiça desenfreada leva invariavelmente as pessoas a quebrarem outros mandamentos.

       Em Provérbios encontramos: “Tal é a sorte de todo ganancioso; e este espírito de ganância tira a vida de quem o possui” (Pv 1.19). Acerca da mulher adúltera diz Salomão: “Não cobices no teu coração a sua formosura, nem te deixes prender com as suas olhadelas” (Pv6.25). “Não tenhas inveja dos homens malignos, nem queiras estar com eles” (Pv 24.1). E todos sabemos que momentaneamente Asafe viveu uma luta interior por não conseguir pôr em prática esse princípio ético, como mostrado no salmo 73.

 


II – Textos proibitivos do Novo Testamento.


          Dentre tantos textos no Novo Testamento que trazem uma versão inibidora e crítica desse mandamento queremos fazer ênfase a alguns. No Novo Testamento a principal palavra para cobiça é Pleonexia “desejo incontrolável de possuir o mundo e seus bens materiais, poder, influência e prestigio”; e Jesus adverte em vários momentos sobre este perigo: Mt 5.28: “Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela”. Mt 16.26: “Pois que aproveitará o homem se ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou que dará o homem em troca da sua alma?” Mc 7.20-22: “E dizia: O que sai do homem, isso é o que o contamina. Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura”. Lc 12.15: “Então, lhes recomendou: Tende cuidado e guardai-vos de toda e qualquer avareza; porque a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui”.

            Em 1 Timóteo 6.10 o apóstolo Paulo se refere à cobiça (philarguria), amor desordenado pelo mundo, se referindo ao amor ao dinheiro como sendo a raiz de muitos males, pelo qual muitos se desviaram da fé.

          Há muitos outros textos que podem ser observados: Rm 7.7; Tg 1.14, 15; 4.2, etc.

 


III – Como o décimo mandamento deve ser compreendido por nós hoje.


         Trata-se aqui da versão positiva do mandamento, ou seja, sua abrangência em não apenas deixar de fazer algo, mas a implicação de ser e fazer.

 

a) Abençoar ao invés de cobiçar

2 Co 9.5 - “Portanto, julguei conveniente recomendar aos irmãos que me precedessem entre vós e preparassem de antemão a vossa dádiva já anunciada, para que esteja pronta como expressão de generosidade e não de avareza”. Essa recomendação bíblica faz-nos refletir que devemos ser uma bênção para o nosso próximo.

 

b) Estar satisfeito com o que Deus providencia.

          O melhor exemplo disso no N. T. é o apóstolo Paulo: “Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes” (1Tm 6.8). Paulo não está ensinando o relaxamento, muito pelo contrário, ele é grande incentivador do trabalho; por razões pessoais inclusive conciliou seu ministério com sua profissão de fazedor de tendas. Ele fala de satisfação e gratidão pelo o que o Senhor nos concede, ele sentia-se desse modo, grato ao Senhor. Ele aprendeu a ser grato tanto na abundância quanto na ausência: “Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4:12-13 NVI).

 

d) Dedicar-se ao trabalho honesto.

          Atos 20.33-35: “De ninguém cobicei prata, nem ouro, nem vestes; vós mesmos sabeis que estas mãos serviram para o que me era necessário a mim e aos que estavam comigo. Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando assim, é mister socorrer os necessitados e recordar as palavras do próprio Senhor Jesus: Mais bem-aventurado é dar que receber”. Paulo apresenta nesses versículos princípios construtivos do décimo mandamento: trabalho honesto e assistência liberal a quem precisa.

 

e) Ter boa vontade.

           1 Pedro 5.2: “pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade”. Um princípio que muitos líderes cobiçosos de nossos dias poderiam atentar. Se uma pessoa tem boa vontade, ou seja, quer o bem para o outro, não estará cobiçando o que tem, não estará tendo inveja dessa pessoa, não fará algo que venha a prejudicar essa pessoa.

 


Conclusão


            Como conclusão gostaria de dar algumas sugestões práticas:


1. Vigie seu coração, caso note brotando a inveja, corte-a na nascente, não der espaço a ela no coração.


2. Busque a aprovação de Deus para o que você almeja e se satisfaça com o que Ele te concede!


3. Não queira algo que outros tem somente para não ficar por baixo, evite a ambição desmedida.


4. Lute para conquistar o que você sonha, mas sem se permitir a inveja para com aqueles que tem o que você não tem.


5. “[...] promover ativamente o bem-estar do próximo em atos de amor fraternal, diaconia, misericórdia e retidão é o caminho traçado por Deus para cumprirmos corretamente o décimo mandamento” (Reifler, 2009).



Referência


RIENECKER, Fritz; ROGERS, Cleon. Chave Linguística do Novo Testamento Grego. São Paulo, Ed. Vida Nova, 1995.

 

 


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