Introdução
Há alguns anos atrás, as grandes
emissoras de TV, tais como National Geographic, SBT e Globo, divulgaram a
descoberta do Evangelho de Judas como algo que traria uma revolução no
cristianismo. Esse ‘novo evangelho’ passou a ser conhecido como ‘o evangelho
proibido’, pois nele era revelado que Judas Iscariotes não foi um traidor e um
terrível pecador, mas que, na verdade, ele foi o maior e mais exemplar
discípulo de Jesus.
Com isso foi vendida a ideia de que
talvez afinal Judas tenha sido um bom discípulo e que os outros textos que
falam do caráter de judas de modo negativo foram um mal entendido dos
discípulos mesclado com um pouco de ressentimento por não compreender os planos
de Jesus. Tal ideia desconsidera a inspiração das Escrituras e é totalmente
distante da verdade bíblica.
Judas foi sim o pior exemplo de pessoa,
aquele que passou três anos diretos com Jesus, comendo, dormindo, ministrando
com Jesus e ouvindo-o.
Esse texto nos fala desse momento
tão crucial da traição de Judas, da prisão de Jesus. Mas o foco não está em
Judas, o foco está em Jesus. Marcos não voltará a falar de Judas, não voltará a
fazer menção ao beijo da traição, Jesus continuará sendo o centro de tudo. Que
os holofotes estejam sempre voltados para a soberania de deus neste momento tão
importante.
Elucidação
Continuamos dentro do Jardim do
Getsêmani com o nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Como vimos no sermão
anterior as horas de agonia e aflição levaram Jesus a vigiar e orar, vencendo
assim a grande tentação. Jesus venceu a tentação e está pronto para enfrentar
Seus inimigos. Essa é a última noite de Jesus com Seus discípulos. E que noite
é essa! Essa noite é uma noite histórica! Essa é uma noite de festa, uma noite
de aflição, uma noite de fraqueza, uma noite de triunfo, uma noite de
conspiração, uma noite de traição, uma
noite de fuga e uma noite de compaixão!
I
– O traidor é manifestado, v. 43-45.
v.43 ‘ENQUANTO ELE AINDA FALAVA, APARECEU JUDAS, UM
DOS DOZE’
A essa altura, Jesus provavelmente
já estava com os outros discípulos que haviam ficado na entrada do jardim. Marcos
gosta de identificar o traidor como ‘um dos Doze’ para ressaltar e
enfatizar quão terrível e profunda foi essa traição. Ele pertencia a um dos
Doze, Judas teve um incomparável privilégio.
Até mesmo a vida de Judas
pode nos ensinar algumas lições:
1 - As maiores oportunidades
nunca irão converter um pecador.
2 - Os maiores privilégios nunca
darão vida ao pecador que está morto em suas transgressões.
3 – Por melhor que sejam as suas
companhias elas não poderão salvar uma alma do inferno.
4 - A melhor pregação no mundo
não pode criar vida e fé, por si mesma, na alma. A salvação pertence à obra
regeneradora do Senhor!
Judas teve todas as oportunidades,
estava perto de Jesus, ouvia Jesus, conversava com ele. Mesmo assim o Senhor não
teve espaço em seu coração.
‘UMA MULTIDÃO ARMADA DE
ESPADAS E VARAS’ [μετὰ μαχαιρῶν καὶ ξύλων] – Essa multidão vem
armada com: ESPADAS [Gk. μάχαιρα] – essa era uma
espada menor e afiada, usada para ataque e corte. Muito usada pelos soldados
romanos. VARAS [Gk. ξύλον] – pedaço de pau ou
bastão de madeira. Essa era a arma usada pelos guardas do Templo.
João 18:3 Então Judas
foi para o olival, levando consigo um destacamento de soldados [coorte
– décima parte de uma legião = 600 homens, ou seja, 60 homens] e alguns guardas
enviados pelos chefes dos sacerdotes e fariseus, levando tochas,
lanternas e armas.
Essa milícia foi enviada pela
liderança de Israel. Essa multidão não é um grupo de pessoas qualquer, mas sim
um grupo enviado pelo Sinédrio. O Sinédrio representava todo o povo em assuntos
políticos e religiosos. Esses são os grupos religiosos que Jesus havia falado
que O rejeitariam (8:31).
‘SAUDAR COM UM BEIJO’ [Gk. ὃν
ἂν φιλήσω αὐτὸς ἐστιν] – “O beijo era um sinal de afeto
especial entre membros da família, bons amigos, e um sinal de honra e afeto
entre um discípulo e seu mestre.” (Craig Keener, The IVP Bible Background Commentary – New
Testament, IVP, pg.177). “Homens na antiga [e moderna]
Palestina costumavam cumprimentar um ao outro com um beijo na face. Esse era a
maneira comum de saudar um venerável rabino e teria parecido um saudar de paz
para os outros discípulos.” (Zondervan llustrated Bible Backgrounds
Commentary, pg 166).
Com esse código utilizado por Judas
notamos primeiramente que Jesus tinha uma aparência simples, não se vestia de
forma pomposa, não havia algo nele fisicamente que o destacasse dos outros
discípulos, por isso a necessidade de ser identificado antes pelo próprio Judas
para que os guardas não prendessem a pessoa errada.
Além disso podemos notar naquele beijo
o ápice da hipocrisia de judas. ‘Beijou’ - a palavra grega
carrega aqui um prefixo sinalizando uma intensidade na ação (καταφιλέω).
Essa palavra pode se referir tanto a vários beijos como a um beijo com mais
carinho e afeto. Essa é a palavra usada na parábola do filho pródigo. Judas não
deu só um beijinho superficial, mas ele deu, provavelmente, um abraço apertado
e um beijo.
Como um artista ele faz de conta, de
forma perfeita, que ele tinha carinho pro Cristo.
Muitas pessoas hoje agem semelhantemente a Judas: se aproximam de Jesus,
o chamam de mestre e o beijam. Aproximam-se de Jesus, mas tal aproximação não
provém da ação do Espírito Santo, mas pela emoção e pressão do momento. Chamam
Jesus de mestre, mas relativizam sua mensagem, não querem negar a s mesmo,
tomar a cruz e perder a sua vida por causa do evangelho. Beijam Jesus, mas o
beijo é para conseguir algo em troca. Isso tudo é hipocrisia. Que o Senhor nos
livre de tal coisa. Que vivamos o verdadeiro amor ao nosso Senhor. Como nos diz Romanos 12.9: “O amor deve ser sincero [sem hipocrisia].
Odeiem o que é mau; apeguem-se ao que é bom”.
II
– Jesus é preso, v. 46-49.
OS HOMENS AGARRARAM JESUS” (NVI) ou “E LANÇARAM-LHE AS MÃOS” (ACF)
[Gk. οἱ δὲ ἐπέβαλον τὰς χεῖρας
αὐτῷ] - O verbo nesse contexto tem o sentido de colocar a mão de forma firme e
até mesmo agressiva sobre um criminoso. Devido ao ódio e ao temor que Ele
fugisse. Então podemos imaginar que não foi uma cena tranquila, os soldados
agiram com brutalidade. Mas diante disso tudo não esqueçamos: Ele não é
agarrado e preso por causa da força e da esperteza de Seus adversários! Mas
porque Ele entrega a Sua própria vida. O nosso Salvador dá a Sua própria vida
em submissão à perfeita vontade de Deus! Como nos diz João 10:17, 18: “Por isso é que meu Pai me ama, porque eu
dou a minha vida para retomá-la. 18 Ninguém a tira de mim, mas eu a dou por
minha espontânea vontade. Tenho autoridade para dá-la e para retomá-la. Esta
ordem recebi de meu Pai”.
No texto paralelo do Evangelho de
João é revela que antes de eles prenderem Jesus ocorre algo que demonstra quem
de fato estava no controle daquela situação.
João 18:1-8
1 Tendo Jesus dito estas palavras, saiu juntamente com seus
discípulos para o outro lado do ribeiro Cedrom, onde havia um jardim; e aí
entrou com eles.
2 E Judas, o traidor, também conhecia aquele lugar, porque Jesus ali
estivera muitas vezes com seus discípulos.
3 Tendo, pois, Judas recebido a escolta e, dos principais sacerdotes
e dos fariseus, alguns guardas, chegou a este lugar com lanternas, tochas e
armas.
4 Sabendo, pois, Jesus todas as coisas que sobre ele haviam de vir,
adiantou-se e perguntou-lhes: A quem buscais?
5 Responderam-lhe: A Jesus, o Nazareno. Então, Jesus lhes disse: Sou
eu. Ora, Judas, o traidor, estava também com eles.
6 Quando, pois, Jesus lhes disse: Sou eu, recuaram e caíram por
terra.
7 Jesus, de novo, lhes perguntou: A quem buscais? Responderam: A
Jesus, o Nazareno.
8 Então, lhes disse Jesus: Já vos declarei que sou eu; se é a mim,
pois, que buscais, deixai ir estes...
Jesus não estava se
escondendo como um ladrão, mas um dos motivos dEle estar no Getsêmani era para
Ele ser encontrado por Judas.
No v. 4 é mostrada a
soberania e valentia de Jesus. É Ele quem se entrega. Ele não correu e nem se
escondeu, mas saiu para encontra-los, mostrando-nos quem está no controle de
tudo!
A resposta deles no v.
demonstra que eles têm Jesus como um homem normal de Nazaré.
"Sou eu",
disse Jesus. A resposta de Jesus revela quem Ele realmente é: SOU EU =
YHWH.
(E Judas, o traidor, estava com eles).
v. 6 Ao som do nome
verdadeiro de Jesus eles caíram – as palavras de Jesus são como uma espada que
quebra os joelhos desses homens e eles se prostram diante dEle. O mesmo Jesus
que tem poder sobre a tempestade, sobre demônios e sobre a morte, tem o poder
de colocar os mais bravos soldados no chão ao som da Sua voz. É importante
notarmos que Judas está no meio deles, mostrando que o poder de prender Jesus
não estava com Judas.
Jesus não só demonstra
Seu soberano poder e autoridade como também Seu profundo amor e cuidado. Ele
pergunta quem eles estão procurando para deixar claro que eles devem prender
somente Jesus. O nosso Salvador mostra mais uma vez Sua misericórdia e graça
para com Seus discípulos.
O texto de João mostra detalhes que
marcos não relata, como o nome de quem utilizou da espada e o nome da pessoa
ferida.
Jo 18.10: “ Então, Simão
Pedro puxou da espada que trazia e feriu o servo do sumo sacerdote,
cortando-lhe a orelha direita; e o nome do servo era Malco”.
Dentro do grupo dos discípulos,
havia um homem chamado Simão, o zelote (3:18). Era normal que os zelotes
carregassem espadas, portanto ele era, provavelmente, o dono das espadas. Era
também normal o uso de espadas para defesa pessoal [havia muitos bandidos nas
estradas]. Pedro, o valentão do grupo, achou que era importante que tivesse uma
em suas mãos.
Mais uma vez revela-se aqui
a falta de domínio próprio de Pedro. Mateus e Lucas nos relatam que, antes
do ataque, houve uma pergunta: Lc 22:49: “Ao verem o que ia acontecer, os que estavam com Jesus lhe disseram:
"Senhor, atacaremos com
espadas?"
Pedro não conseguiu esperar a
resposta de Jesus! Isso demonstra falta de domínio próprio. Ele estava sendo
controlado pela carne e não pelo Espírito!
A Bíblia no exorta
muito sobre a importância do domínio próprio: Pv
25:28: “Como a cidade com
seus muros derrubados, assim é quem não sabe dominar-se”; Pv 16:32: “Melhor é o homem paciente do que o
guerreiro, mais vale controlar o seu espírito do que conquistar uma cidade”; Pv 29:11: “O
tolo dá vazão à sua ira, mas o
sábio domina-se”; Pv 29.22: “O homem irado provoca brigas, e o de
gênio violento comete muitos pecados; Tg
1:19-20: “Meus amados irmãos,
tenham isto em mente: Sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e
tardios para irar-se, pois a ira do homem não produz a justiça de Deus”.
Jo 18:11 Jesus,
porém, ordenou a Pedro: "Guarde a espada! Acaso não haverei de
beber o cálice que o Pai me deu? "
Ele ordena Pedro a guardar a espada
por três motivos:
1 – “Todos que empunham a
espada, pela espada morrerão” – Violência naquela hora geraria mais
violência. Pena de morte para assassinato!
2 – “Posso pedir a meu Pai e
Ele enviaria doze legiões de anjos” – Seria tolice atacar, quando Jesus
simplesmente poderia ter toda aquela multidão massacrada pelos seus anjos.
3 – “Para o cumprimento das
Escrituras” – Eles não devem lutar, pois as Escrituras não profetizaram
sobre retaliação da parte do Servo Sofredor.
O nosso Senhor nos mostra que as
armas da nossa guerra são espirituais.
v. 48 “SAÍSTES COM ESPADAS E VARAPAUS A PRENDER-ME, COMO A UM SALTEADOR?”
-- Jesus mostra quão covardes e quão cheios de injustiça são esses homens!
SALTEADOR (Gk. λῃστής)
– Jesus é cercado e preso como um marginal e saqueador. “λῃστής é uma
palavra tão pejorativa que ninguém usaria para si mesmo.” (R.T.
France, TNIGTC on Mark, Eerdmans, pg 594)
v.49 “TODOS OS DIAS EU ESTAVA COM VOCÊS, ENSINANDO
NO TEMPLO, E VOCÊS NÃO ME PRENDERAM”
Jesus mostra toda a hipocrisia
desses homens. Jesus abre as cortinas do palco para que todos vejam quão
hipócritas e quão cheios de perversidade são esses homens.
É como que ele estivesse dizendo: “Onde
vocês estavam na segunda-feira, na terça e na quarta? Pois eu estava lá no
templo ensinando!”
“MAS AS ESCRITURAS PRECISAM SER CUMPRIDAS”
Toda aquela situação era parte do
perfeito plano de Deus!
** Aquela era a hora da prisão, a
hora de ser levado como um criminoso, não era a hora de retaliar e lutar, era a
hora em que todos iam abandoná-Lo, pois tudo aquilo já havia sido estabelecido
por Deus! Is 53:7: “Ele
foi oprimido e afligido, contudo não abriu a sua boca; como um cordeiro foi
levado para o matadouro, e como uma ovelha que diante de seus tosquiadores fica
calada, ele não abriu a sua boca”.
III
– Jesus é abandonado por todos, v. 50-52.
Exatamente como o nosso Senhor Jesus
havia falado algumas horas antes (14.27-31), aqueles que haviam prometido total
aliança e perseverança agora fogem!
Cadê a valentia? Onde está a
fidelidade? Cadê aquela força prometida? Cadê a bravura?
Que nós possamos olhar para esse
versículo e, ao invés de julgar com grande severidade esses homens, possamos
clamar pela graça e misericórdia de Deus! Assim como eles, em muitos momentos
de nosso modo particular também podemos em hora está demonstrando valentia e
outra estarmos sendo covardes abandonando o Senhor me meio à tribulação.
Mas como é glorioso saber
que Ele jamais nos desampara. Em Hb 13:5-6 o autor de Hebreus cita Dt
31.6-8: “De
maneira nenhuma te deixarei, nunca jamais te abandonarei. Assim, afirmemos
confiantemente: O Senhor é o meu auxílio, não temerei. O que me poderá fazer os
homem?"
O texto ainda nos mostra um relato
curioso de um jovem que estava seguindo-o Jesus coberto apenas por um lençol, e
que fugiu quando foi descoberto.
A grande maioria dos
comentários fala que esse jovem é o autor do livro (João Marcos), pois em
nenhum outro evangelho nós encontramos esse relato.
Embora ele tenha fugido naquele
momento, mas a fuga em si não era o problema.
Jesus perguntou a multidão quem eles
estavam procurando para que os seus homens pudessem escapar (Jo 18:3-8). O
jovem fugiu, pois era a única coisa a ser feita. Ele fugiu, pois ele sabia que
só Jesus poderia andar naquele caminho. Ele fugiu, pois ele sabia que ele seria
mais útil para o Reino vivo do que morto.
Conclusão
Com qual personagem desse relato atualmente
você tem mais se assemelhando?
1) Você tem se assemelhado com Judas? Se aproximou
de Jesus pelas emoções, chama Ele de ‘mestre’, mas odeia os Seus ensinos. Chama
Jesus de ‘mestre’, mas nunca vai à Palavra durante o dia para ouvir os Seus
mandamentos. Beija Jesus no domingo, mas durante a semana o trai com tudo e
todos. Demonstra bela afeição no domingo, mas durante a semana a cobiça reina
em seu coração.
2) Com a multidão que foi prender
Jesus? Alguns têm ido à igreja há algum tempo e ainda continuam hostis às
coisas de Deus. Rejeitam a verdade de Deus e são influenciados pelos outros.
3) Você tem se assemelhado a Simão? Tem andado
descontrolado, sem domínio próprio – brigando, discutindo, falando palavras
indecentes, agressivo com tudo e todos. Às vezes tendo zelo pela coisa certa,
mas sem o conhecimento correto.
4) Você tem se assemelhado com o
Jovem coberto com o lençol? Tem seguido de perto o nosso
Senhor e Salvador. Tem estado acordado e vibrante na jornada espiritual.
5) Você está parecido com Cristo? Esse é o
personagem que todos nós devemos buscar ser iguais! Vigiando, orando, se
submetendo a vontade de Deus, cheio de misericórdia, valente, sem temor dos
sofrimentos que o Pai lhe impõe...
I Co 11:1: “Tornem-se meus
imitadores, como eu o sou de Cristo”.
I Pe 2:21 “Para isso vocês foram chamados, pois também
Cristo sofreu no lugar de vocês, deixando-lhes exemplo, para que sigam os seus
passos”.
Que como igreja nós todos possamos
seguir os passos do nosso Senhor e Salvador Jesus! Uma igreja cheia de
verdadeiros imitadores de Cristo!
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