HISTÓRIA DA REFORMA (parte 3)


A VIDA E A TEOLOGIA DE ZWÍNGLIO


          Ao contrário da Alemanha, a Suíça tinha um ambiente favorável ao estabelecimento da Reforma. No período da Reforma a Suíça estava dividida em treze cantões, cada um com seu governo independente. Tinham governo democrático, e cada cantão podiam decidir basicamente qual religião iriam adotar. O exército suíço era famoso e forneciam mercenários para muitos países da Europa, inclusive para o papado.   As cidades suíças eram centros de cultura e nelas o humanismo se estabeleceu. A igreja de Roma então lidava de forma cautelosa com os cantões suíços, não tinham muita autoridade naquela nação.
          Huldeich Zwínglio (1484 – 1531) fez parte da primeira geração de reformadores. Seu pai era fazendeiro e juiz de Wildhaus, podendo então financiar uma boa educação a Zwínglio para o sacerdócio.
          No ano de 1502 ele se formou em bacharel em artes na Universidade de Basiléia, e em 1504 recebeu o grau de mestre. Veio a servir o papado como capelão em 1516, inicialmente na paróquia de Glaurus. Entre 1516 e 1518 foi transferido para Einsideln.  A partir desse momento iniciou sua oposição ao sistema romano de indulgência e a imagem negra da Virgem Maria.
          Zwínglio não era apenas teólogo, era também um patriota e político. Por isso, na época em que pastoreava em Zurique, no começo de 1519, opôs-se à prática suíça de vender os serviços de seus soldados. Obtive êxito, pois em 1521 Zurique proibiu tal prática.
          O reformador suíço era um homem profundamente conhecedor das Escrituras. Tinha uma base intelectual forte, havia sido influenciado pelo humanismo de Erasmo. O seu sucessor em Zurich, Heinrich Bullinger conta que ele memorizou em grego todas as epístolas paulinas, tendo copiado cada uma delas palavra por palavra. Zwínglio veio a se tornar um grande pregador expositivo das Escrituras. O início da Reforma na Suíça teve um episódio curioso. No período da quaresma, por ser proibido aos católicos comerem carne, os cidadãos de Zurique cometeram ‘um pecado terrível’, comeram salsicha. Surgiu a polêmica de que quebraram o jejum quaresmal, pois afinal, salsicha é carne. Os cidadãos, porém, argumentavam com base nos ensinos de Zwínglio na autoridade exclusiva da Bíblia. Como a liturgia romana começava a se alterar, as autoridades católicas resolveram promover um debate público. Depois desse debate, os líderes civis escolheriam a fé que a cidade e o cantão adotariam.
          Sozinho, Zwínglio enfrentou todos os teólogos enviados por Roma. Ele apresentou 67 artigos que tratavam da salvação pela fé, da autoridade da Bíblia, da supremacia de Cristo na igreja e do direito do sacerdote ao casamento. Condenou todas as práticas romanas não provadas pela Bíblia. O Conselho da cidade declarou Zwínglio vencedor do debate. Em 1525 a Reforma se completou em Zurich com a supressão da missa.
          Zwínglio perdeu o apoio de seguidores radicais conhecidos como anabatistas que insistiam na doutrina do rebatismo.
          Infelizmente, no Colóquio de Marburg os protestantes suíços e os protestantes alemães não conseguiram unir forças. Zwínglio e Lutero discordaram na concepção de Ceia do Senhor, e por apenas um artigo dentre quinze não puderam selar uma união.
          Vários cantões ao adotarem os princípios Zwinglianos vieram a formar um sínodo das igrejas evangélicas suíças em 1527. A Bíblia foi traduzida para a língua do povo. O papa por temer perder o apoio dos mercenários suíços, não reagiu ao que estava acontecendo. Porém, alguns cantões que eram fiéis ao papa organizaram uma União Cristã dos Cantões Católicos. Em 1529 estoura uma guerra entre os cantões católicos e protestantes. Houve uma trégua em Cappel, na qual ficou decidido que a maioria dos cidadãos de cada cantão escolheria a religião a seguir, com promessa de tolerância aos protestantes nos cantões papais. Zwínglio, porém, tentou conquistar Genebra para a Reforma, por isso uma nova guerra começou em 1531. Ele estava no campo de batalha como capelão, e morreu em combate com um machado nas mãos. Por fim, cada cantão recebeu o controle total de seus negócios internos e Zurique entrou em aliança com a Liga Cívica Cristã dos Cantões Reformados. Heirich Bullinger foi o competente sucessor de Zwínglio. Em 1549, através do acordo de Zurich, zwinglianos e calvinistas conjugaram forças nas Igrejas Reformadas da Suíça.


A teologia de Zwínglio

          A teologia do reformador suíço em muitos pontos coincidia com a de Lutero. Não pretendemos ser exaustivos, portanto, analisaremos apenas os tópicos principais.

A providência em vez do acaso

          Zwínglio tinha um elevado entendimento da providência divina. Ele compreendia que a providência divina não se relaciona apenas com os grandes eventos da história, mas com tudo na vida.

“Não podemos deixar de admitir que nada, nem mesmo a menor das coisas, acontece sem que seja ordenado por Deus. Pois quem se importa tanto e é tão curioso assim para saber quantos fios de cabelo tem na cabeça? Ninguém. Deus, entretanto, sabe quantos. De fato, nada é tão pequenos em nós, ou em qualquer outra criatura, que não seja comandado pela providência de Deus, que tudo sabe e tudo pode.”

          A doutrina da providência é a base para a predestinação. Ele diz que “todo esse problema de predestinação, livre arbítrio e mérito encontra-se na questão da providência”. A predestinação é, portanto, um exemplo muito especial de providência divina.
          Zwínglio não estava disposto a admitir que pregava uma dupla predestinação, porém, parecia este ser o caso, pois ele afirmava que a “eleição quanto a rejeição são obras do livre arbítrio de Deus”. E a atitude de Deus para com os réprobos é que ele os “rejeite, expulse e repudie”.
          Um dos aspectos da doutrina da eleição era a salvação dos “pagãos piedosos”. Para ele havia alguns escolhidos por Deus que viveram fora dos limites cronológicos e geográficos da história da salvação como Sócrates, Sêneca e todo homem piedoso desde o início do mundo.


As Escrituras Sagradas em vez da tradição humana

          Zwínglio foi totalmente revolucionário em termos de pregação, deixou de lado o lecionário tradicional e passou a pregar as Escrituras capítulo por capítulo. Fez uma séria exposição bíblica.
          O reformador tinha um conceito bem amplo de “Palavra de Deus”. Embora ela englobasse as Escrituras, ia além. A palavra de Deus era o próprio Cristo e também o evangelho, e definiu evangelho como “não apenas o que Mateus, Marcos, Lucas e João escreveram, mas tudo o que Deus já revelou ao homem”. A Palavra então não estava restrita a expressão escrita. Ele entendia que isso não diminuía a autoridade das Escrituras, mas sim a sustentava, pois indicava a fonte principal da Bíblia, o próprio Deus.


O batismo como evento eclesiástico

          Zwínglio negou que o batismo tivesse a capacidade de remover a culpa do pecado original, como ensinava a igreja romana. O batismo não podia ser a causa instrumental da regeneração, pois essa foi consumada na cruz do calvário.
          A partir de 1524 Zwínglio defendeu o batismo infantil com base no vínculo da aliança. De modo resumido o argumento é que os ritos do Antigo Testamento, a circuncisão e a páscoa, foram substituídos na nova aliança pelo Batismo e Ceia do Senhor; o batismo, portanto, é a circuncisão do cristão. O batismo cristão deriva não da ordem de Mt 28, mas do batismo de João. Embora o batismo infantil não fosse ordenado express verbis, pode ser inferido de algumas passagens. Aqui ele se mostra fraco exegeticamente afirmando que a igreja pratica o batismo infantil no Novo Testamento, para indicar isso ele citou o abraço de Jesus às criancinhas em Lc 18.15-17. Citou o batismo de famílias inteiras em Atos. E disse também que em nenhuma passagem há a proibição de batizar crianças.


A Ceia do Senhor

          Ao contrário de Lutero, Zwínglio entendia que Cristo não estava corporalmente presente na Ceia do Senhor. Ele via neste sacramento um ato de comemoração, embora admitisse que Cristo está espiritualmente presente à fé dos crentes. Lutero entendia que o corpo de Cristo estava “em, com e sob” os elementos. Para Zwínglio porém, o símbolo e a coisa simbolizada estavam separados por uma distância – a extensão entre o céu e a terra. As palavras de Cristo “isto é o meu corpo” não devem ser interpretadas literalmente. A Ceia é um memorial.
          No Colóquio de Marburgo Lutero havia escrito em uma mesa as palavras “Hoc est corpus meum”, e cobriu a inscrição com um pano. No decorrer do debate aconteceu o seguinte diálogo:

           Zwínglio: Seria uma vergonha crer em tão importante doutrina, ensiná-la e defendê-la, e ainda assim ser incapaz ou ter má vontade de citar uma única passagem das Escrituras que a provasse.

          Lutero (tirando a cobertura da inscrição na mesa): Este é meu corpo! Aqui está nossa passagem das Escrituras. Você ainda não a tirou de nós, como tenta fazer; não precisamos de nenhuma outra. Meus caríssimos senhores, visto que as palavras de meu Senhor Jesus Cristo estão aqui, Hoc est corpus meum, não posso verdadeiramente ignora-las, mas devo confessar e acreditar que o corpo de Cristo encontra-se lá.


O MOVIMENTO ANABATISTA




          O movimento radical de reforma anabatista, que esteve presente em alguns países; iniciou-se na Suíça sob a liderança de Conrad Grebel (1498 – 1526). Grebel esteve com Zwínglio até 1525. Ele realizava estudos bíblicos com Felix Mans. Concluíram que o batismo infantil não tinha base bíblica. Em consequência, começaram a batizar os adultos, primeiramente entre eles, George Blaurock foi batizado por Grebel, este pois, batizou a Blaurock e muitos outros.
          Na Alemanha, o líder do movimento foi Balthasar Hubmaier (1481 – 1528). Ele era doutor em teologia pela Universidade de Ingolstadt, onde foi aluno do adversário de Lutero Jonh Eck. Ao ter contato com os radicais suíços adotou suas ideias e foi batizado juntamente com 300 pessoas por afusão no ano de 1525. Ensinou a separação da igreja e o Estado, a autoridade da Bíblia e o batismo dos crentes. Foi queimado numa estaca em 1528 por ordem do Imperador, e sua esposa foi afogada no Danúbio pelas autoridades católicas romanas.
          Na Holanda com Menno Simons (c. 1496 – c. 1561); tinham doutrinas radicais que desafiavam tanto os católicos quanto os protestantes. Pregavam eles contra o batismo infantil por entenderem não haver base bíblica para o mesmo, a comunhão dos bens, a completa separação da igreja e o estado, negavam o pecado original e houve tentativas de previsão da volta de Cristo. Evidentemente, houve vários grupos anabatistas, e embora tivessem algumas doutrinas em comum também divergiam entre si em alguns pontos teológicos. Por consequência de suas doutrinas foram tidos por hereges tanto por católicos quanto por protestantes. Sofreram terrível perseguição. Muitos foram forçados a pular de penhascos, condenados à morte por afogamento, queimados em estacas, enforcados.
          O movimento anabatista teve grande atração para os artesãos e camponeses, por não terem sido alcançados pelos reformadores. Eles buscavam com certeza uma consolação para seus terríveis sofrimentos naquele duro século XVI.



JOÃO CALVINO




          Calvino nasceu em Noyon, em Picardy, ao norte da França. Seu pai era um respeitado cidadão e conseguiu benefícios eclesiásticos para a educação do filho. Calvino estudou na Universidade de Paris, onde teve contatos com o humanista Guillaume Cop, e através do seu primo Pierre Olivetan conheceu as ideias protestantes. Para fazer a vontade de seu pai foi estudar Direito na Universidade de Orleans, transferiu-se depois para a Universidade de Bourges em 1529.
          Ao se converter adotando as ideias da Reforma, abandonou imediatamente os benefícios eclesiásticos que recebia. Calvino foi forçado a abandonar a França em 1534 por ter colaborado com Nicolas Cop, reitor da Universidade de Paris, na elaboração de um documento no qual continha ideias humanistas e reformadoras.
          Em Basiléia terminou sua grande obra “As institutas da religião cristã” em 1536 com apenas 26 anos de idade. Depois de muitas edições essa obra magnífica chegou à sua forma e edição final em 1559.
          Guilherme Farel (1489 – 1565) havia sido enviado a Genebra pelo cantão de Berna para ali estabelecer a Reforma. Era um excelente pregador, mas humilde o suficiente para reconhecer sua limitação administrativa. Ao saber que Calvino estava pernoitando em Genebra não teve dúvida do que fazer. Foi até ele e lhe pediu ajuda. Calvino não estava interessado em se envolver diretamente na obra da Reforma, desejava apenas contribuir com seus escritos e para tanto necessitava de tranquilidade para estudar. Ele se recusou, porém Farel lhe disse que Deus amaldiçoaria a ele e a seus estudos se em tão grave emergência se recusasse a ajudar. Isso impressionou tanto Calvino que ele permaneceu em Genebra e foi ordenado ministro de ensino no mesmo ano de 1536.
          Dentre as mediadas reformadoras que Calvino e Farel tomaram se recusaram a dar a Ceia do Senhor àqueles que se encontravam em pecados graves e escandalosos, porém muitos desses eram pessoas poderosas e influentes na cidade, tal atitude custou-lhes o exílio. Calvino então foi pastorear uma igreja de refugiados franceses em Estraburgo. Ao contrário de Genebra, que não remunerava Calvino pelos seus serviços, e ele mesmo nada cobrava, a igreja de Estraburgo cuidava muito bem de seu pastor. Calvino, aliás, era um homem necessitado de muitos cuidados, pois era extremamente enfermo, tinha gastrite, hemorróidas, dores de cabeça constantes, e outras enfermidades. Em Estraburgo Calvino se casou com uma viúva de um pastor anabatista, Idelette, com quem teve um filho, que veio a falecer ainda criança em 1549. Idelette também veio a falecer.
          Em 1541 Calvino foi convidado a retornar a Genebra. Ele estava satisfeito em Estraburgo e não pretendia voltar a Genebra, foi convencido a retornar em caráter temporário até por as coisas em ordem. Porém, ele acabou ficando permanentemente em Genebra.
          Agora Calvino estabelece as Ordenanças Eclesiásticas, estabelecendo quatro classes de oficiais na igreja. Essas Ordenanças estabeleciam uma associação de pastores para dirigir a disciplina, um grupo de mestres para ensinar a doutrina, um grupo de diáconos para administrar a obra de caridade, e sobre eles, o consistório, composto de seis ministros e doze anciãos, para supervisionar a teologia e a moral da comunidade, com a faculdade de punir, quando necessário, com a excomunhão os membros renitentes.
          Lamentavelmente em 1546, 28 pessoas foram executadas e 76 exiladas. E Servetus, por ter ensinado contra a doutrina da Trindade foi queimado vivo em 1553. Legalmente Calvino não foi o responsável pela morte de Servetus, foi o conselho dos Quatros, que governavam a cidade. É bom salientar que a desobediência à igreja naquela época era também desobediência ao estado, portanto, digna de morte.
          João Calvino morreu em 1564, Teodoro Beza (1519 – 1605), reitor da academia de Genebra, tomou a liderança do trabalho em Genebra.



A teologia de Calvino

          Assim como nos reformadores anteriores, faremos menção apenas às principais doutrinas calvinistas.

O Deus Trino

          Calvino foi o único dos reformadores que dedicou atenção à doutrina da Trindade. Ele chegou a conversar com antitrinitários genuínos, como Servetus, Gentile e Gribaldi.
          Calvino foi impecavelmente ortodoxo em suas formulações sobre a doutrina da Trindade:
                    “...quando professamos crer em um só e único Deus, pelo termo Deus entende-se uma essência única e simples, em que compreendem três pessoas ou hipóstases...” (Inst., I, XII, 20).

          Calvino na verdade não gostava de termos não-bíblicos como ousia, hipóstases, persona, Trinitas; porém reconheceu a utilidade deles para tornar a doutrina mais clara. Calvino jamais deturpou as Escrituras para defender qualquer doutrina, com a doutrina da Trindade não foi diferente. Acertadamente considerava fracas e espúrias provas como dizer que o plural de Deus em Gênesis 1.1, (Elohim), a tríplice manifestação de louvor dos serafins em Is. 6.3, ou a afirmação de Jesus, “eu e o pai somos um” (Jo 10.30) para afirmar a Trindade.


A providência

          Em sua doutrina da providência Calvino atacou dois equívocos populares da época, o fatalismo e o deísmo. O fatalismo é uma doutrina estóico que diz haver na natureza leis que tornará inevitável tudo quanto acontece. O deísmo por sua vez, afirma que Deus criou o mundo e abandonou-o, não se relaciona com ele. Contra o fatalismo Calvino ensinou que as coisas acontecem não por causa de leis naturais, mas por determinação divina. “Que, por Sua sabedoria, decretou desde a extrema eternidade [o] que haveria de fazer e, agora, por Seu poder, executa [o] que decretou” (Inst., I.XVI, 8). Contra o deísmo ele declara que a providência “às mãos, não menos que aos olhos, diz [Lhe ela] respeito” (Inst., I, XVI, 4).
          Se Deus determinou tudo o que acontece, surge a questão se Ele não se torna cúmplice das obras más dos ímpios. Calvino afirmava que não, fazendo uma distinção entre vontade e preceito de Deus.

                    “... enquanto por instrumentalidade dos ímpios Deus leva a cabo [o] que decretou em Seu juízo absconso, não são [eles] excusáveis, como se Lhe estejam a obedecer ao preceito, que deliberadamente, violam em sua [desregrada] cupidez” (Inst. , I, XVII, 4).


 A oração

          A esse tema Calvino dedica o capítulo mais longo das Institutas. Ele definiu oração como “o principal exercício da fé, mediante a qual recebemos diariamente os benefícios de Deus”.

                    Os fiéis não oram para contar a Deus o que ele não sabe, para pressioná-lo em suas tarefas ou apressá-lo quando demora, mas sim a fim de alertar a si mesmos para buscá-lo, para exercitar a fé meditando em suas promessas, livrando-se de suas cargas ao se elevarem a seu íntimo. [...] Mantenha esses dois pontos: nossas orações são previstas por ele em sua liberdade; contudo, o que pedimos, conseguimos pela oração. (Com. sobre Mt 6.8).

          Calvino apresentou quatro regras de oração. Primeiro: devemos nos aproximar de Deus reverentemente. Devemos evitar a leviandade de falar com Deus como quem fala com um amigo celeste, “o homem lá de cima”. A segunda regra é que oremos com uma percepção sincera de necessidade, e penitentemente.

                    Deus não estabeleceu a oração
Para arrogantemente nos envaidecer perante ele
Ou valorizar grandemente nossas próprias coisas.
A oração serve para confessarmos, lamentarmos
Nosso trágico estado;
Como as crianças lançam seus problemas
Sobre seus pais,
Assim é conosco diante de Deus.
Essa percepção do pecado estimula-nos, incita-nos,
Desperta-nos a orar.

          A terceira regra segue a segunda: devemos abandonar toda a confiança em nós mesmos e humildemente suplicar perdão.
          A quarta regra é que oremos com esperança confiante: “... assim prostrados e subjugados de verdadeira humildade, sejamos, não obstante, animados a orar, com segura esperança de alcançar resposta” (Inst. , III, XX, 11).


A predestinação

          A teologia de Calvino é lembrada principalmente por conta da predestinação, fato curioso, haja vista que ele mesmo dá pouca atenção a essa doutrina em suas Institutas. A doutrina da predestinação de Calvino é basicamente o que Lutero, Zwínglio e Agostinho pregaram.
          Resumiremos a doutrina da predestinação de Calvino em três palavras: absoluta, particular e dupla. Absoluta porque não está condicionada a nenhuma contingência finita, mas baseia-se somente na vontade imutável de Deus. Desse modo ele rejeita qualquer noção de predestinação baseada na presciência divina:

                    O conhecimento prévio de Deus não pode ser o motivo de nossa eleição, porque, quando Deus [olha para o futuro e] observa toda a humanidade, ele encontra a todos, do primeiro ao último, debaixo da mesma maldição. Assim, vemos quão tolamente os frívolos balbuciam quando atribuem ao puro e simples conhecimento prévio o que deve estar fundamentado na boa vontade de Deus.
          Em segundo lugar, a predestinação é particular, ou seja, pertence a indivíduos e não a grupos de pessoas. Isso implica que Cristo não morreu por todos indiscriminadamente, mas apenas pelos eleitos.
          E finalmente a predestinação é dupla. Deus, para o louvor da sua misericórdia, ordenou alguns indivíduos para a vida eterna, e para louvor da sua justiça, enviou outros para a condenação eterna.


A Ceia do Senhor

          A doutrina da Ceia do Senhor encontrou em Calvino um equilíbrio entre os extremos de Lutero e Zwínglio. Ele concordava com Zwínglio ao negar a presença corporal de Cristo no sacramento, mas insistia numa presença real, ainda que espiritual. Concordava com Lutero então, que a Ceia não era um mero símbolo vazio – a verdade da coisa significada está certamente ali – mas um meio de “real participação” em Cristo (Inst. , IV, XVII, 10-11).
          Calvino afirma que a Ceia é primeiramente a expressão de uma dádiva da graça de Deus ao homem, e só secundariamente, uma refeição comemorativa e um ato de profissão. A Ceia portanto, fortalece a fé do comungante.

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