CONTEXTO HISTÓRICO DA PALESTINA NA ÉPOCA DE JESUS

A Palestina da época de Jesus com certeza foi um tempo de muitos detalhes históricos que precisam ser compreendidos para que possamos ter uma visão melhor das origens do Cristianismo. O estudante atento que se preocupa com o contexto histórico da Palestina terá a vantagem de entender melhor alguns eventos narrados nos evangelhos e em Atos. É, portanto, de grande importância um estudo sobre este tema. Embora esta obra seja bastante condensada, pode ser útil para se compreender aquela época, e isto é essencial se quisermos de fatos interpretar corretamente os textos do Novo Testamento.




Sentido do termo Palestina

          A Palestina era a terra que os hebreus conquistaram dos filisteus, também conhecida como terra de Canaã. Depois da conquista toda a região ficou conhecida como terra de Israel, 1 Sm 13.19; 1 Cr 22.2; Mt 2.20, porém, depois da divisão do reino, aplicava-se ao reino do norte. Após a era cristã os escritores gregos e latinos a denominavam Palestina e na Idade Média ficou conhecida como Terra Santa.



HISTÓRIA DA PALESTINA


          Em sua política expansionista Roma chega ao Oriente Médio em 63 a.C., por meio do general Pompeu. Era um Império que nessa época crescia constantemente. Depois de cinco séculos sua dominação já se estendia à parte da Europa, da Ásia e da África. Assim também a Palestina passou a fazer parte do Império Romano.
         A Palestina então era uma região de localização estratégica, por ser uma região de passagem havia um constante trânsito de soldados, comerciantes, mensageiros, diplomatas. Essa região possuía cidades importantes para o comércio, como Cesaréia e Jerusalém, onde havia estradas bem estruturadas e portos que facilitavam a comunicação e o transporte de mercadorias e pessoas.
          Durante todo o período do Novo Testamento a Palestina foi governada por membros da família herodiana, descendentes dos asmoneus, ou então por procuradores diretos de Roma. Na época do nascimento de Jesus quem governava era Herodes, o Grande. Era um homem que desconfiava constantemente de conspirações. De fato, o ambiente da família de Herodes era de ganância e luta pelo poder. A situação era tal que ele acusou dois de seus filhos de conspirar contra ele condenando os mesmos à morte. Herodes morreu em 4 a.C., cinco dias antes um outro filho seu Antípatro havia sido executado acusado de conspiração. Os judeus o consideravam como um tirano egoísta, mas os romanos como um vassalo fiel. Após sua morte seus filhos sucederam-no. Arquelau reinou na Judéia de 4 a.C. – 6 d.C. Herodes Antipas foi nomeado tetrarca da Galiléia e da Peréia de 4 a.C. – 39 d.C. ambos foram parar no exílio, Arquelau devido às queixas dos Judeus contra ele, e Antipas por ordem de Calígula (37 – 41 d.C.).
          O terceiro filho de Herodes, Filipe (4 a.C – 34 d.C) foi tetrarca das regiões da Ituréia e traconites (Lc 3.1). Tudo indica ter sido um governante justo e benevolente, ao contrário de Arquelau que foi cruel e despótico. Filepe morreu em 34. d.C. e seu território passou para o domínio de Herodes Agripa I.
          Após a morte de Arquelau, sua tetrarquia foi governada por procuradores romanos, eram os territórios de Judéia, Samaria e Iduméia. Dentre os procuradores o quinto deles ficou sendo o conhecido, Pilatos, devido à crucificação de Jesus.
          Quirino, que era governador da Síria, foi enviado a Judéia no ano 6 d.C para realizar um recenseamento para efeitos de tributação, o que provocou o descontentamento de alguns judeus que foram liderados por um galileu chamado Judas. Atos 5.37 faz menção dele.
          Herodes Agripa I, herdeiro da família dos macabeus ou hasmoneus, tendo o apoio dos fariseus por ser um observador da Lei conseguiu desbancar os procuradores romanos e assumiu o poder, permanecendo como governador de 37-44 d.C. Era hostil aos cristãos, morreu repentinamente após um discurso no ano 44 d.C, o texto de Atos 12.19-24 relata como isso se deu.
          Outros governadores de menor importância para o contexto do Novo Testamento foram Fadus (44-46 d.C), Alexandre (46-48 d.C.) e Cumanus (48-52 d.C).
          Félix (52-60 d.C.) era hostil aos judeus. Em sua sede de resolver o problema de frear a ação dos zelotes, grupo favorável à luta armada contra a dominação romana, mostrou uma inabilidade, pois sua severidade serviu apenas para incrementar a ação dos sicários. Os sicários eram assassinos que surgiram do grupo dos zelotes responsáveis por muitos assassinatos, inclusive do sumo sacerdote Jônatas.
          Festo (60-62 d.C) governou em período de instabilidade e caos social. Crescia então o fervor dos fanáticos religiosos e políticos. Morreu durante seu mandato. Predominava a anarquia em Jerusalém, para se ter uma ideia surgiu grupos de sacerdotes rivais que competiam pela autoridade, chegavam a travar batalhas nas ruas. Quem substituiu Festo foi Albino (62-64 d.C.), mas ele não estava interessado de resolver os graves problemas de sua tetrarquia, buscou apenas a autopromoção, embora tenha prendido a muitos, colocava em liberdade aqueles que lhe pagassem um suborno favorável.
          Segundo Josefo, mais terrível que Albino era o seu sucessor, Floro (64-66 d.C.). Ele chegou a saquear cidades inteiras, permitia que os ladrões atuassem livremente desde que lhe pagassem suborno. A situação tornara-se então intolerável e de 66 a 70 d.C. os judeus travaram uma guerra contra a dominação romana. A derrota dos judeus foi trágica com a invasão de Jerusalém por Tito em 70 d.C, a cidade foi completamente destruída, assim como o Templo. Milhões de judeus foram mortos, o sangue jorrava nas ruas naturalmente.



GEOGRAFIA


          A Palestina no tempo de Jesus possuía uma extensão de terra mediana, era uma estreita área situada entre a África e a Ásia, funcionando como uma espécie de ponte entre essas regiões. Suas coordenadas geográficas estão nos paralelos de 31 e 33 ao norte e nos meridianos 32 e 34 ao leste. Com um território menor que o estado do Espírito Santo, possuía uma superfície de cerca de 34.000 Km² e cerca de 650 mil habitantes. Encontrava-se dividida em áreas menores: Judéia, Samaria e Galiléia, à oeste; Ituréia, ao norte; Gualanítade, Batanéia, Traconítide, Auranítide, Decápole e Peréia, à leste; e Iduméia ao sul. Todo esse território era margeado pelo Mar Mediterrâneo, no extremo Oeste. Ao leste estava o Rio Jordão que desemboca no Mar Morto, ao sul, entrecortando toda região havia uma cadeia de montanhas e montes com 600 metros de altura, sendo que os mais altos estavam situados na Galiléia e no Hermon.


Clima

          A Palestina possuía duas estações bem definidas, uma chuvosa e outra de extremo calor. O período chuvoso, de novembro a março, era bastante rigoroso e com muitas chuvas regulares. No restante dos meses a temperatura média pairava entre os 23,5º graus. As temperaturas mais altas nessa estação seriam no vale do Jordão e no planalto.
          Uma curiosidade sobre o clima eram os constantes ventos com suas variáveis. Os do oeste e do sudoeste, no calor, eram sempre agradáveis, pois traziam umidade e orvalho. Aqueles, porém, oriundos do leste, no entremeio das duas grandes estações, tornavam o clima seco e quente e, por vezes, desidratava pessoas e animais. Há por fim, um vento que vem do deserto (Kasmim) que poderia em apenas um dia tornar os campos áridos por períodos de meses.




COMÉRCIO E ATIVIDADES


Profissões

          Na época de Jesus todos deveriam exercer uma profissão, do contrário seriam desprezados na sociedade. Até mesmo os escribas tinham uma profissão. O principal ramo de profissão era o do artesanato. As profissões mais comuns eram de fabricantes de tendas (como era o caso do apóstolo Paulo), fabricantes de pregos, comerciantes de linho, padeiros, curtidor, copista, fabricante de sandália, arquiteto, alfaiate, comerciante de betume. Algumas dessas profissões eram exercidas inclusive por doutores da lei, enquanto outras eram tidas como desprezíveis, como tecelão, pastor de ovelhas e cobrador de impostos. A profissão de médico era considerada como de artífice, e estava presente em cada região e em cada povoado. As mulheres tinham como sua ocupação principal serem lavadoras de roupas, a despeito disso havia os lavadeiros profissionais.
          A indústria de construção expandiu-se bastante em Jerusalém devido ao investimento da família herodiana nas construções.


Aspectos comerciais

          Havia um intenso comércio na Palestina, dividido entre um comércio interno que abastecia as cidades e o externo, responsável pelas importações e exportações. A profissão de comerciante era bastante valorizada. Alguns deles detinham o controle de grandes comércios atacadistas que realizavam importações, como o mercado de Jerusalém. Eram importados produtos de luxo para serem consumidos pela a elite social e pelo Templo. A exportação era de produtos como frutas, óleo, vinho, peixes e manufaturas como perfumes e betume.
          A produção era baseada no trabalho escravo, classe composta por uma grande maioria da população. Os mesmos não eram considerados pessoas, mas coisas que podiam ser vendidas ou trocadas segundo a vontade de seus donos.
          A corte romana obrigava os cidadãos a pagarem impostos elevadíssimos levando o povo a viver sob condições econômicas precárias. Os impostos foram aumentados muitas vezes para suprir as despesas das construções realizadas pela família herodiana.


SEITAS JUDAICAS


          Na época de Jesus os judeus da Palestina dividiam-se em três principais facções religiosas: fariseus, saduceus e essênios. É importante observar que em cada um desses grupos outros pequenos grupos eram formados em torno da figura de um rabi (mestre) ou de uma escola rabínica.


Fariseus

          Os fariseus surgiram do antigo partido dos hassidim, conservadores estremados que apoiaram a luta dos macabeus contra a dominação estrangeira. Também eles têm o mérito de resistirem ao helenismo para a preservação de sua cultura e fé. Os fariseus eram mestres na interpretação das tradições orais dos rabis. Socialmente provinham de famílias de artífices e mercadores da classe média, como todos os judeus exerciam uma profissão, Paulo, por exemplo, era fabricante de tendas. Exerciam grande influência sobre a massa popular, porém, segundo Josefo na época de Jesus contavam apenas 6.000 deles que viviam na Palestina (Antiguidades, Livro XII, Cap. X, Séc. 5; citado por Packer, Tenney e Whit Jr. Em “O mundo do Novo Testamento”).
          Doutrinariamente os fariseus acreditavam na ressurreição dos mortos, na predestinação, na imortalidade e a vinda de um Messias libertador político. Criam como Escritura Sagrada todo o Antigo Testamento. Sua plataforma de atividade era a sinagoga.


Saduceus

          Os saduceus eram a classe sacerdotal do Templo. Com uma religiosidade mais formal e elaborada que os fariseus aceitavam apenas a Torá como revelação divina. Os saduceus se deixaram influenciar grandemente pela política grega de helenização cultural. Acreditavam no livre arbítrio do homem, negavam a existência de anjos e demônios, e também não criam na ressurreição.


Essênios

          Também tiveram a sua origem dos hassidim. Era grupo, ou melhor, vários grupos de costumes extremos. Viviam uma vida simples em comunidades no deserto. Assim como os fariseus acreditavam em anjos e demônios, tinham uma vaga concepção da ressurreição individual, esperavam para muito breve a vinda de um messias e eram deterministas (criam na predestinação). Praticavam ritos para purificar-se física e espiritualmente.


Zelotes

          Os zelotes eram um grupo de pessoas que não aceitavam pacificamente a dominação estrangeira de Roma sobre seu país. O líder mais conhecido dos Zelotes foi Judas, o Galileu, mencionado em Atos 5.37. Ele liderou uma rebelião contra Roma que veio a fracassar, porém, foi o início de tempos de conflitos que veio a culminar com a invasão de Jerusalém e destruição do Templo em 70 d.C.
          Dentre os zelotes estava aqueles que foram conhecidos com sicários (“gente da adaga”), assassinos que matavam aqueles que de alguma forma estivessem cooperando com Roma. Circulavam na multidão em momentos de festividades com adagas escondidas sob suas vestes, fazendo assim suas vítimas.


Herodianos

          Os herodianos eram aqueles que preferiam o governo da dinastia de Herodes o Grande a o governo dos romanos. Eram formados pessoas de diversas seitas religiosas. As Escrituras chegam a mencioná-los três vezes (Mt 22.16; Mc 3.6; 12.13).


Samaritanos

          Estes eram judeus que tinham sua linhagem misturada com os assírios, pois quando Israel foi vencido pelos assírios e deportados os habitantes de samaria aderiram ao casamento misto com colonizadores assírios. Além disso, estabeleceram seu próprio local de culto, no monte Gerizim em contraposição ao Templo de Jerusalém. Por tudo isso havia uma inimizade preconceituosa dos judeus de “sangue puro” para com os samaritanos.


Seguidores de João Batista

          Não era exatamente uma seita no real sentido da palavra. João Batista teve um modo de vida singular e uma pregação singular. Vivia no deserto e pregava vigorosamente contra os pecados dos judeus. Ele fez questão de deixar claro que ele não era o Messias. O próprio João Batista aconselhou aos seus discípulos a seguirem Jesus de Nazaré, não havia, portanto, uma rivalidade entre os dois rabis. Mantinha oposição contra o casamento de Herodes com sua cunhada, pois o seu irmão ainda era vivo. Foi preso e morto sob as ordens de Herodes Antipas. Há uma pequena seita no Oriente Próximo conhecida como “mandeanos” que alega serem descendentes dos seguidores de João Batista.
          Alguns estudiosos afirmam que João Batista teve influência dos essênios, o que é bem plausível que ele tenha tido contato com este grupo religioso.




BIBLIOGRAFIA


 DAVIS, John D. – Dicionário da Bíblia.  Rio de Janeiro – RJ, editoras Candeia e JUERP, 20ª edição, 1996.


PACKER, J. I.; TENNEY, Merril C.; WHITE JR., Willian – O mundo do Novo Testamento. São Paulo, SP, Editora Vida, 2006.


PINTO, Carlos Osvaldo Cardoso – Foco e desenvolvimento no Antigo Testamento, São Paulo, Hagnos, 2006.


METZGER, Martim – História de Israel, Editora Sinodal, 2ª edição, 1978.

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