Introdução
O
relato da transfiguração revela imagens para uma cena de filme. Montanha,
vestes resplandecentes, aparições de mortos, um Pedro empolgado, medo, nuvem,
sombra e, por fim, uma voz celeste pedindo que escutem o seu filho. Como vemos,
oportuniza uma série de imagens e poucos diálogos. É um relato por assim
dizer, carismático, mas deve ser visto muito mais do que isso nele, é também
uma visão da glória de Cristo em meio à sua existência terrena de humildade, e
portanto também podemos perceber a transcendência divina. Jesus é mostrado àqueles
discípulos em sua glória como o Filho do Homem, e que, portanto, ilustra a
glória que também haveremos de ter quando da ressurreição em Cristo. Mas além disso
está presente essa relação da transcendência divina com sua imanência, ou seja
o fato de que a revelação e transfiguração de Jesus tinha foco na preparação
dos discípulos para sua missão.
Elucidação
Ao
contrário do que pode parecer, a revelação é dada aos discípulos. Não se trata
de uma instrução de Deus a Jesus, p. ex., confirmando seu chamado. São os
discípulos que necessitam ver essa transfiguração, não Jesus que necessitava
ser transfigurado. São eles que são instruídos. Experimentam “em hora
antecipada e em alturas solitárias” o que um dia há de preencher todas as
terras (Pohl, p. 270).
I – OS DISCÍPULOS CONTEMPLAM A GLÓRIA DE
CRISTO, V. 2-3.
Jesus havia terminado de instruí-los
acerca de sua morte e ressurreição (8.31-33) e também lhes falou que eles
sofreriam por levar a cruz e que, portanto, havia diante deles um grande
desafio (8.34-38). Agora, ele faz uma interpolação ao seu discurso para na
continuidade do seu ensino mostrar-lhes como poderiam estar sendo vitoriosos.
Os discípulos tem a oportunidade de ver Jesus em sua glória. Desse modo, de uma
forma prática podemos tirar daquele momento da transfiguração uma aplicação de que
Jesus tem luz própria. No texto paralelo de MT 17.2 diz que o “o seu rosto
resplandecias como o sol”. Um evento miraculoso sem dúvida, mas que testifica
de Cristo como luz. Jesus diz muito claramente em João 8.12: ”Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá
a luz da vida”. A luz faz transparecer aquilo que anterior a ela estava
oculto. Como luz do mundo Jesus traz à tona a pecaminosidade deste mundo. Os
discípulos portanto também deveriam ser luz neste mundo. Mas tanto eles como
nós apenas refletimos a luz de Cristo. Não temos luz própria, pelo contrário,
as trevas de nossos corações foram por iluminadas.
Este Jesus com luz própria continua
a iluminar o caminho de seus seguidores.
v. 3 Os discípulos vêem as vestes de
Jesus resplendecerem, sinal da santidade de Cristo. Vestes brancas representavam
pureza. Para os discípulos ali presentes, portanto, deveriam refletir na
santidade de seu Senhor lembrando a responsabilidade de viverem em conformidade
com esta santidade. Cristo ilumina nosso caminhar neste mundo, é necessário,
portanto, que assim como os discípulos possamos ter momentos como esse,
oportunidades de contemplação do divino, não estou falando do céu abrir-se para
você nos dias de hoje, como alguns buscam freneticamente, por exemplo, em
reuniões em lugares específicos como montes, etc; estou me referindo ao monte
espiritual que você deve subir diariamente, ao culto que você deve prestar ao
Senhor, à contemplação da santidade do Senhor, aos momentos de oração que
enriquecem nossa vida espiritual e nos capacita para o cotidiano, para os desafios
que havemos de enfrentar como as tentações.
Os discípulos deveriam refletir
sobre sua própria santidade, que deveria ser reflexo da glória de Cristo.
Lembre-se, não há verdadeiro cristão sem santidade.
II – OS DISCÍPULOS TENTAM COLOCAR A
EXPERIÊNCIA ACIMA DO SIGNIFICADO, V. 4-6.
É triste observarmos isso, mas de
certo modo é compreensível para o momento. Era de fato algo espantoso ver Jesus
conversando com Moisés e Elias, e mais provável é que os discípulos sabiam que
eram eles por uma iluminação divina. Não
precisamos nos torturar para dar um sentido satisfatório às palavras de Pedro.
Elas fazem parte do tema da falta de compreensão dos discípulos, da reação
contra o caminho de sofrimento de Jesus (cf. v. 32). Pedro não conseguia reunir
a majestade que via com o “é necessário” do sofrimento do messias. Ele queria
parar o tempo, conferir duração ao momento. Se pensarmos bem perceberemos que é
desse mesmo modo que procuram agir aqueles que supervalorizam momentos particulares
de experiências pentecostais. Esquecem que vida com Deus se dá nos momentos
cotidianos da vida, e por isso podem estar participando de uma experiência
extática muito emotiva em um dia, e no dia seguinte agir conforme a impiedade.
Uma coisa são as experiências particulares, outra bem diferente é o dia-a-dia
com Deus em um mundo caído no pecado. É preciso viver a maravilha do evangelho principalmente
fora do momento de culto. Quando nos reunimos, cantamos, oramos; além de
estarmos rendendo à Deus a adoração que lhe é devida estamos também nos
preparando para a nossa vida fora do âmbito do culto coletivo. Nas lutas
diárias e encruzilhadas da vida, a percepção do agir de Deus é outra que nas
cerimônias dominicais. Por causa dessas dificuldades é preciso dialogar em cima
dos fatos, lembrar um ao outro as revelações passadas, refletir conjuntamente
sobre o que Deus vai mostrando no meio das lutas.
v. 6 Pois não sabia o que dizer, por
estarem eles aterrados. O versículo soa como uma desculpa. Em
meio ao terror de Deus, um ser humano fica como que desmantelado. Dos seus
lábios só sai um gaguejar desorientado e sem sentido. Ao contrário da ousadia
petulante de algumas pessoas que não demonstram reverência ao Senhor em suas
vidas, a presença divina causa naquele que de fato tem a graça da iluminação
espiritual; sentimento de nulidade, percepção de sua própria impotência. O exemplo
clássico é o de Isaías 6, onde o profeta teme até morrer pelo fato de ter
contemplado por breve momento a santidade divina em uma visão que o Senhor lhe
concedeu. “Então disse eu: Ai de mim!
Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de
impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!” É
assim que devemos nos sentir diante da santidade do Senhor, sujos, tendo a
percepção de pecado, caindo de joelhos diante do Senhor da Glória. Sem saber o
que dizer, pois o que pode dizer o homem para se justificar diante do Senhor.
OS DISCÍPULOS SÃO INSTRUÍDOS ACERCA DA
RESSURREIÇÃO DE JESUS, V. 7-10.
v. 7 Novamente aqui a afirmação
divina de que deveriam ouvir a pessoa de Jesus, comprovando sua deidade. Desse
modo fia para nós o fato de que é a ele que devemos atentar, nãos às nossas
interpretações erradas de experiências supostamente espirituais, ou mesmo aos
nossos sentimentos, ou vozes alheias à verdade divina.
v.9 Jesus ordena aos três discípulos
que não divulguem o que acabaram de ver e ouvir. A publicidade de um momento de
glória antecipada ofuscaria a cruz e a ressurreição. A propaganda de milagres
desvia a atenção do que é fundamental. Olha-se para o dedo que aponta em
direção à lua, desviando o olhar do satélite que reflete a luz do sol. Jesus
não necessitava desse tipo de propaganda, ademais havia o perigo de ele ser
preso antes do momento adequado.
Conforme vemos no versículo 10,
mesmo sendo a segunda vez que Jesus fala de sua morte e ressurreição, os
discípulos não compreendiam o que lhes estava sendo dito. Mas não era por falta
de instrução do Senhor. Não é nosso intento aqui discorrer propriamente sobre a
ressurreição, essa reflexão ficará para outro momento, mas para o fato do que é
dito a eles de que deveriam ouvir ao Senhor.
Como podemos ouvir a cristo?
Principalmente por intermédio de sua Palavra infalível e inerrante, também pela
orientação iluminadora do Espírito Santo que fala à nossa consciência, por meio
de pessoas que o Senhor usa em momentos de significado existencial quando nos
transmitem a Palavra de Deus.
Conclusão
1. Contemple a Cristo para viver em
santidade. E que esta santidade possa ser perceptível de modo prático ma
integridade da vida: honestidade, paz nos relacionamentos naquilo em que
depender de vocês, sinceridade, fidelidade conjugal e nas amizades e nos
relacionamentos de trabalho, verdade na palavras, etc.
2. “Desce, Pedro! Desejavas repousar no
monte. Desce! Prega a palavra de Deus, insiste a todo o momento, oportuna e
inoportunamente, repreende, exorta, encoraja com toda a paciência e doutrina.
Trabalha, não olhes a canseiras, nem rejeites dores ou suplícios, a fim de que,
pela candura e beleza das boas obras, tu possuas na caridade aquilo que está
simbolizado nas vestes brancas do Senhor” (Santo Agostinho,
Sermão 78, 6).
Isto que significa que a igreja após
o culto deve ir ao mundo para manifestar a glória de Cristo.
3. O que deve nos interessar é o que Jesus
diz, e se alguém prega em desacordo à Palavra de Cristo, seja anáterma
(considerado separado de Cristo). Se um concílio de igreja estiver em
desarmonia com a Palavra também deve ser recusado. É a Jesus que devemos ouvir,
ele nunca nos decepcionará, nunca nos desencaminhará. Felizes aqueles que
conhecem experimentalmente o significado do texto: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem.
Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, eternamente, e ninguém as
arrebatará da minha mão” (Jo 10.27, 28).
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